Peculato: desvios de conduta e impactos na sociedade

Peculato

Carolina Carvalho de Oliveira comenta o crime de peculato, suas penalidades e as diferenças em relação à corrupção passiva

Crime cometido por agentes públicos – servidores ou detentores de mandatos eletivos – que se apropriam indevidamente ou desviam dinheiro, bens móveis ou outros recursos sob sua responsabilidade, o peculato, infelizmente, tem sido uma prática recorrente no cenário nacional. Essa apropriação ou desvio ocorre através do abuso da confiança depositada no agente público para o exercício de seu cargo, o que fere diretamente o interesse público e o bem-estar social. 

O peculato é um tipo de crime específico, porquanto seu praticante deve obrigatoriamente ser um agente público – e a vítima é a sociedade como um todo, que acaba prejudicada pela má gestão dos recursos públicos e pelo enriquecimento ilícito de alguns indivíduos. Essa prática nefasta afeta o bom funcionamento das instituições públicas, a eficiência da prestação dos serviços à população e a confiabilidade do sistema político e governamental.

 

A criminalista Carolina Carvalho de Oliveira, sócia do escritório Campos & Antonioli Advogados Associados, em entrevista ao Poder360, esclareceu que as penalidades para esses crimes variam de 2 a 12 anos de prisão e multa – sendo esta última “calculada no fim do processo penal com as considerações previstas pelo artigo 59 do Código Penal”.

Nesse caso, o indiciamento é fundamentado em um inquérito policial, sendo de competência exclusiva do delegado de polícia. Após a conclusão do inquérito, o Ministério Público (MP) é responsável por apresentar ou não a denúncia à Justiça.

 

Corrupção passiva e peculato

É comum haver confusão conceitual entre corrupção e peculato, uma vez que ambos estão relacionados a desvios de conduta no setor público. Assim como o peculato, a corrupção passiva também é praticada por agentes públicos, mas se caracteriza pela solicitação ou aceitação de vantagens ou benefícios indevidos em razão do cargo ocupado.

O artigo 317 do Código Penal define a corrupção passiva da seguinte forma: “solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”.

Já o peculato, conforme o artigo 312 do Código Penal, equivale a “apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio”.

 

Caso Bolsonaro

O jornal O Estado de S. Paulo revelou que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) teria tentado introduzir no país um estojo de joias valiosas, presente do governo da Arábia Saudita ao Brasil, sem declará-lo à Receita Federal. Após o episódio, foram descobertas outras duas caixas, sendo que uma delas não havia sido registrada junto às autoridades – e a outra foi incorporada ao acervo pessoal de Bolsonaro.

Depois que os casos vieram à tona, Bolsonaro entregou ao Tribunal de Contas da União (TCU) três pacotes. Mesmo assim, a Polícia Federal iniciou uma investigação para apurar a conduta do ex-presidente. Segundo o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB), o caso pode levar Bolsonaro a ser indiciado por peculato.

Bolsonaro nega qualquer ilegalidade relacionada às peças trazidas ao Brasil, afirmando que é acusado por receber um presente que não havia solicitado. Além disso, ele declara que “nada foi escondido”. 

Contudo, segundo Oliveira, o ex-presidente “pode ser indiciado por peculato, pois as investigações se amoldam ao tipo penal e esse ato é exclusivo da autoridade policial que preside as investigações. Qualquer crime praticado contra a administração da justiça pode ser investigado pelas autoridades. No caso das joias, entendo que o peculato abrange a conduta a ser investigada, com cautela, em busca da conformação da autoria e materialidade”.

A advogada ressaltou que a devolução dos bens não altera a natureza do delito de peculato. Por outro lado, ela acrescentou que “as investigações podem chegar à ausência de indícios da prática do crime, ou seja, ausência de intenção na apropriação para proveito próprio ou alheio”. A análise da intenção por trás das ações de Bolsonaro será, portanto, crucial para determinar o desfecho do caso na esfera criminal.

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