Presidente do STF, ministro Roberto Barroso diz que corte irá votar mudanças no Marco Civil da Internet para responsabilizar Big Techs por conteúdo veiculado
O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, anunciou na última segunda-feira (9) que a mais alta instância jurídica do país planeja introduzir alterações significativas na legislação que diz respeito à responsabilidade das gigantes da tecnologia, conhecidas como Big Techs, pela disseminação de conteúdo em suas plataformas.
O objetivo do STF é encontrar um ponto de equilíbrio entre a proteção da privacidade dos usuários e a necessidade de cumprir as regulamentações relacionadas à divulgação de conteúdo, criando uma espécie de “liberdade monitorada”.
Segundo a legislação atual, estabelecida após a implementação do Marco Civil da Internet, empresas como Facebook, Instagram, Twitter (ou X), YouTube, Tik Tok, e outras, só podem ser legalmente responsabilizadas se descumprirem ordens judiciais para a remoção de conteúdo considerado ilegal. Isso significa que o intervalo de tempo entre a identificação de postagens que violem a lei, a decisão de removê-las e a efetiva exclusão desses conteúdos pode ser significativamente longo.
O Supremo Tribunal Federal visa precisamente reformar esse cenário, buscando agilizar o processo e garantir uma maior eficiência na remoção de conteúdo prejudicial à sociedade.
Liberdade vigiada: Marco Civil da Internet foi o primeiro passo
Com a ascensão da Internet e a proliferação das redes sociais, o poder legislativo viu-se compelido a estabelecer parâmetros para a operação das plataformas digitais, a fim de garantir o respeito aos direitos fundamentais dos usuários. Nesse contexto, em 2014, foi promulgado o Marco Civil da Internet, sob a Lei nº 12.965.
De maneira geral, essa legislação aborda os seguintes conceitos-chave:
- Neutralidade da Rede: Impedindo que os provedores de Internet possam privilegiar ou discriminar o tráfego de dados com base em critérios como conteúdo, origem, destino, serviço ou aplicação.
- Privacidade: garantindo a proteção da privacidade dos usuários, exigindo que as empresas de Internet respeitem a confidencialidade dos dados pessoais dos usuários.
- Responsabilidade civil: definindo regras que estabelecem a responsabilidade dos provedores de serviços online por conteúdo gerado por terceiros. Nesse contexto, apenas podem ser responsabilizados mediante ordem judicial.
- Armazenamento de dados: estabelecendo que os provedores de aplicações na Internet devem manter registros de conexão por um período limitado, com a finalidade de auxiliar em investigações criminais.
- Liberdade de expressão: protegendo a liberdade de expressão online, permitindo que os usuários se manifestem livremente, desde que estejam em conformidade com a legislação vigente.
- Colaboração com as autoridades: definindo os procedimentos para a colaboração entre empresas de Internet e as autoridades em investigações de natureza criminal.
STF quer implantar exceções à regra fundamental do Marco Civil da Internet
No cenário atual, as gigantes da tecnologia, as chamadas Big Techs, só enfrentam consequências legais se não cumprirem uma ordem judicial para retirar determinados conteúdos de suas plataformas. Entretanto, uma guinada nas regras pode estar a caminho, conforme anunciado pela Suprema Corte.
De acordo com o Ministro Barroso, a mais alta instância judiciária do país busca redefinir o panorama, tornando as plataformas também responsáveis por retirar conteúdos ofensivos de forma autônoma, ou seja, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário.
O Supremo Tribunal Federal tem em mente estabelecer duas exceções ao atual Marco Civil da Internet, no que diz respeito à responsabilidade civil das plataformas:
- Quando a publicação em questão tiver caráter criminoso;
- Quando ocorrer a violação de direitos fundamentais.
Isso implicaria que uma notificação privada, como a que acontece atualmente, só seria necessária em casos envolvendo conteúdo íntimo ou que violem direitos autorais. Essas mudanças podem representar um novo paradigma na responsabilização das empresas de tecnologia por conteúdo em suas plataformas.
Para Carolina Carvalho de Oliveira, criminalista, sócia do Campos & Antonioli Advogados Associados, escritório especializado em Direito Penal Econômico, “as exceções trazidas pelo ministro podem ajudar na celeridade de obtenção de informações capazes de cessar as condutas delitivas, o que seria muito produtivo”.
Entretanto, na prática, as exceções demandam um aperfeiçoamento de toda a sistemática que envolve a lei do Marco Civil e, em muitos casos, pode onerar aquele que deverá fornecer os dados, passível, portanto, de um aparelhamento e especificidade para a viabilidade das exceções, salienta Carolina.
Justiça em Tempos de Transformação Digital
Os presidentes do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, e do Tribunal Constitucional Alemão, juiz Stephan Harbarth, se reuniram no último dia 09, na conferência “Digitalização e Democracia” na renomada Universidade de Goethe, em Frankfurt, Alemanha. O evento promoveu um diálogo bilateral entre Brasil e Alemanha, explorando o papel da Justiça em meio à profunda transformação digital que caracteriza o mundo contemporâneo.
Durante sua participação, o Ministro Barroso defendeu veementemente a implantação de um algoritmo capaz de remover conteúdos ofensivos e criminosos da Internet com agilidade. “Deve haver um algoritmo projetado para lidar com comportamentos ilícitos, uma vez que não existe controle humano viável sobre o volume avassalador de postagens online”, afirmou enfaticamente.
Adicionalmente, o ministro ressaltou a necessidade de que essa tecnologia possa identificar postagens criminosas antes que se espalhem amplamente pela rede.
Barroso aponta que a eficaz regulamentação das redes digitais é “imperativa e incontornável” nos dias atuais.
A criminalista acredita que “na prática, seria muito útil facilitar o acesso aos elementos capazes de identificar o violador dos direitos fundamentais”.
Nos próximos dois meses, o Supremo Tribunal Federal do Brasil deve avaliar dois casos de grande relevância que abordam a flexibilização do Marco Civil da Internet. Isso sinaliza que a discussão sobre a vigilância e a liberdade na Internet nunca esteve tão centralizada e em destaque no âmbito da corte suprema como no presente momento.
Carolina Carvalho de Oliveira, ainda ressalta: “estamos cada vez mais na era digital e o aperfeiçoamento em busca de uma justiça célere é sempre bem-vindo, desde que devidamente capacitado”.
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