Proposta visa o endurecimento do combate à pedofilia, mas medidas precisam ser tratadas com cuidado, aponta a criminalista Carolina Carvalho de Oliveira
A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 1.776 de 2015, que torna pedofilia crime hediondo. A proposição, que segue para a análise do Senado, é importante na medida em que “dá uma seriedade maior a esses crimes, mas não é só isso” – observa Carolina Carvalho de Oliveira, sócia do escritório Campos e Antonioli Advogados Associados. Em entrevista ao Estadão, ela defendeu que é preciso um conjunto de práticas e tratamentos de políticas criminais que possam auxiliar na punição daqueles que são efetivamente culpados.
Ao passo em que a medida fortalece o combate à pedofilia, é fundamental cautela, aponta a advogada, pois “quando se eleva um crime ao patamar de hediondo, qualquer acusação desencadeará uma investigação muito mais séria”.
Tendo em vista o alto índice de erros judiciários, que acabam condenando inocentes, somado à alta porcentagem de presos provisórios, em situações nas quais a inocência ainda pode ser constatada, a criminalista observa que “ao mesmo tempo em que é necessário punir toda e qualquer violência praticada, no caso de uma eventual inocência, o acusado terá menos elementos para acessar uma flexibilização da política criminal”.
O texto determina que condenados ou presos temporários por crimes envolvendo pedofilia previstos no Código Penal ou no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não possam usufruir dos direitos de progressão de regime, saídas temporárias e liberdades provisórias.
Em casos relacionados à produção, posse ou distribuição de conteúdo sexual com crianças ou adolescentes, serão estabelecidas condições para que os presos possam receber os benefícios – como a proibição de se aproximar de escolas de ensino infantil, fundamental ou médio e de frequentar ambientes que possuam parques infantis. Nessa situação, também será obrigatório o uso de tornozeleira eletrônica, tanto para saídas temporárias quanto para prisão domiciliar.
Violência infantil
O Brasil aparece em 2º lugar no ranking da exploração sexual de crianças e adolescentes, ficando atrás apenas da Tailândia. Dados da Secretaria de Direitos Humanos do governo federal apontam que em 2021 foram registradas mais de 119 mil denúncias. Levando em consideração a alta taxa de subnotificação, a situação pode ser ainda pior.
De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que analisou os números de crimes cometidos em 2021, o país registrou média diária de 130 casos de violência sexual contra crianças e adolescentes. No período, foram contabilizados 66.020 boletins de ocorrência de estupros contra crianças. Destes, 76,5% aconteceram em ambiente doméstico.
O estudo constatou ainda um acréscimo expressivo, em relação a 2020, na “divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia”: de 1.851 para 3.181.
PL 1.776/15
O Projeto de Lei nº 1.776 de 2015, de autoria dos deputados Paulo Freire (PL-SP) e Clarissa Garotinho (União Brasil-RJ), determina, entre outras medidas, que a Lei de Crimes Hediondos (Lei nº 8.072) passe a englobar os atos de “induzir alguém menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem” e “praticar, na presença de alguém menor de 14 anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem”.
Se aprovado em definitivo no Congresso Nacional, o PL aumentará as penas para crimes como estupro de vulneráveis, por exemplo, que passará de 15 para 20 anos. Em episódios de propagação de pornografia relacionada a crianças e adolescentes, a pena subirá de cinco para seis anos. Também são previstos agravantes caso o conteúdo pornográfico faça apologia ao estupro, podendo levar a uma condenação de 12 anos de reclusão. Em casos de reincidências, haverá o incremento de pena em 70%.
“Deve-se levar em consideração que as crianças, devido ao seu incompleto desenvolvimento físico e mental são vulneráveis, não tendo, por isso, compreensão dos atos praticados contra eles, nem mesmo possuem a capacidade de evitar abusos praticados contra elas. Portanto, o Estado tem a obrigação de adotar Políticas Criminais mais rígidas na prevenção e repressão de crimes dessa natureza”, pontuaram os autores na justificativa da proposição.
De acordo com eles, “a proposta ora apresentada visa a dar concretude à devida proteção penal aos abusos cometidos contra nossos pequenos brasileiros, objetivando atuar na prevenção e repressão de delitos que têm o potencial de destruir a vida de um pessoa, uma vez que a vítima dessas condutas, inequivocamente, carregará para o resto de sua vida, as marcas deixadas pelos abusadores”.
Definição
Etimologicamente, o termo “pedofilia” deriva do grego “paidofilia”, junção dos vocábulos “paidós” (que significa “criança”) e “philia” (traduzido por “amor” ou “amizade”). Trata-se de um distúrbio que leva o sujeito a atrair-se sexualmente por crianças.
Juridicamente, o conceito de pedofilia tem sido empregado para denotar os crimes de natureza sexual em que um adulto pratica atos libidionoso com uma criança – que é incapaz de compreender e reagir aos abusos cometidos.
Denuncie
Todos podem denunciar casos de violações de direitos humanos por meio do Disque 100. O número de atendimento, disponível em todo o país, serve para encaminhamento das denúncias aos órgãos competentes.
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