Carolina Carvalho de Oliveira comenta a polarização e o clima de tensão que têm resultado em cada vez mais artistas, políticos e pessoas públicas sendo constrangidos e atacados por suas opiniões
O recente aumento de hostilidade e ataques contra personalidades de diferentes ideologias gerou um grande debate sobre os limites entre a liberdade de expressão, o crime de difamação e até mesmo o crime de perseguição. A advogada criminalista Carolina Carvalho de Oliveira, sócia do Campos e Antonioli Advogados Associados e integrante do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), destaca a importância de considerarmos esta questão com cuidado para evitar a banalização da criminalização em função da opinião.
O limite entre a liberdade de expressão e o assédio político
Enquanto algumas figuras públicas preferem manter a discrição, outras se posicionam abertamente sobre questões políticas, culturais e sociais. No entanto, diante da crescente polarização ideológica, explodem as ocorrências de políticos e artistas confrontados, hostilizados e constrangidos em ambientes como restaurantes, aeroportos e locais de lazer.
Nesse contexto, a advogada criminalista chama a atenção para os limites da liberdade de expressão: “a polarização política que o Brasil enfrenta pode levar a preocupações com a criminalização de opiniões políticas críticas de maneira objetiva”.
Entre os mais recentes ofendidos, destacam-se o músico e ex-ministro da cultura Gilberto Gil, a atriz e ex-secretária de cultura Regina Duarte e políticos como Ciro Gomes (PDT), quarto colocado na última eleição presidencial, e o ex-presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (PSDB).
“As figuras públicas estão sujeitas a críticas e posições contrárias, o que traz uma peculiaridade que deve ser avaliada caso a caso”, observa a especialista. “É evidente que qualquer ação que visar ferir a honra de uma pessoa, ou persegui-la de forma a causar danos físicos ou psicológicos, deve ser combatida, e os responsáveis, punidos.”
O ordenamento jurídico brasileiro contempla a punição a esses delitos, informa Carolina, que alerta, no entanto, ser necessária a comprovação de que o autor objetivou causar danos à honra ou à integridade física da vítima – “ou seja, que teve a intenção de ferir o sujeito”.
Ela ponderou, ainda, que “ninguém deve ser ofendido ou perseguido, mas as posições públicas acabam por resultar em manifestações ou opiniões divergentes e, em alguns casos, com ânimos acirrados e, muitas das vezes, sem a intenção de ferir ou gerar dano à honra da figura pública”.
Liberdade de Expressão
A liberdade de expressão está relacionada ao direito de manifestação do pensamento, que garante a possibilidade de as pessoas expressarem suas idéias e opiniões sobre política, cultura, ciência e outros assuntos sem sofrer perseguição ou repreensão por parte do governo ou de outras pessoas.
A Declaração dos Direitos Humanos, no artigo 19, estabelece que essa garantia “implica o direito de não ser perturbado pelas suas opiniões e o de buscar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão”.
A liberdade de expressão é um princípio fundamental que não pode ser cerceado, pois isso constituiria censura prévia. Contudo, vale ressaltar que a liberdade de manifestação não implica em anistia para possíveis consequências daquilo que for expresso.
Legalmente, o direito de um indivíduo se encerra quando viola garantias do próximo. Sendo assim, o limite seria a responsabilização por eventuais danos, tanto na esfera cível quanto na criminal.
Lei do Stalking
A Lei 14.132/21 incluiu o artigo 147-A no Código Penal, que tipifica como crime a perseguição de alguém de forma reiterada, utilizando qualquer meio, com o objetivo de ameaçar a integridade física ou psicológica da pessoa, restringir a sua capacidade de locomoção ou invadir ou perturbar a sua esfera de liberdade ou privacidade.
A pena prevista para este crime é de reclusão por um período entre 6 meses e 2 anos, além de multa. Se o ato for praticado contra crianças, adolescentes, idosos, mulheres por razões de gênero ou com o concurso de duas ou mais pessoas, ou com o emprego de arma, a pena será acrescida em metade.
Calúnia e difamação
Caluniar é a atitude de mentir ao acusar alguém de ter cometido um delito que na verdade não foi praticado. Para ser enquadrado no artigo 138 do Código Penal, é preciso que haja uma falsa acusação de um comportamento criminoso. A pena prevista é de detenção de seis meses a dois anos. Note-se que também incorre na prática quem, tendo conhecimento da mentira, a repassa e divulga.
Já o crime de difamação consiste em desacreditar um indivíduo. É um ataque à reputação da vítima através da propagação de uma situação vexatória. A conduta é contemplada pelo artigo 139 do CP – “difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação” – e pode levar à detenção de três a doze meses mais multa.
Injúria
O crime de injúria está previsto no artigo 140 do Código Penal e pode ser punido com detenção de um a seis meses ou multa. Se a injúria for cometida com violência ou vias de fato, consideradas aviltantes pelo seu tipo ou pelo meio utilizado, a pena prevista é detenção de três meses a um ano, além de multa e pena correspondente à violência.
Em casos em que o delito é cometido com base em elementos relacionados à raça, cor, etnia, religião, origem, idade avançada ou deficiência, a pena é aumentada para reclusão de um a três anos e multa. Se o crime é cometido mediante pagamento ou promessa de recompensa, a penalização é dobrada.
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