Criminalista Douglas Antonioli comenta projeto que beneficia réus de julgamentos com decisões empatadas
O princípio “in dubio pro reo”, que preceitua a interpretação favorável ao réu em situações de dúvida, tem sido um pilar fundamental do Direito Penal brasileiro e poderá ganhar ainda mais relevância com a aprovação definitiva do projeto de lei (PL) nº 3.453/2021. A proposta torna obrigatório o benefício ao réu em casos de empate em julgamentos de processos penais por órgãos colegiados.
Projeto que beneficia réus de julgamentos com decisões empatadas
A matéria, já aprovada pela Câmara dos Deputados e que agora está sob avaliação do Senado Federal, tem sido objeto de polêmicas, pois alguns parlamentares argumentam que sua implementação poderá beneficiar atividades criminosas.
Douglas Antonioli, sócio do escritório Campos & Antonioli Advogados Associados, defende a importância da iniciativa, argumentando que “por analogia, o texto reflete a aplicação da presunção de inocência, do ‘in dubio pro reo’”. Apesar de o princípio já ser considerado em julgamentos de pedidos de habeas corpus, segundo o criminalista, alguns parlamentares apontam que a decisão favorável ao réu não está tão clara em outros tipos de processos.
O advogado explica que o projeto de lei prevê a postura mais favorável ao réu em julgamentos por órgãos colegiados – “caso haja empate, inclusive quando o julgamento ocorra na ausência de algum dos membros do colegiado, seja por falta do magistrado ou por declaração de impedimento ou suspeição”.
O relator do PL, deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA), afirma que a proposta busca consolidar a presunção de inocência como uma norma de juízo, admitindo também a concessão de habeas corpus mesmo sem um pedido formal da defesa.
Doutas Antonioli enfatiza que, conforme o texto, essa decisão favorável ao réu em casos de empate no colegiado será incorporada ao Código de Processo Penal e às normas procedimentais específicas para certos processos que tramitam no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal – tais como crimes de ação pública, habeas corpus e recursos.
Tramitação
O projeto foi discutido no plenário da Câmara apenas um dia após a aprovação de um pedido de urgência, que acelera a tramitação de proposições no Congresso. Deputados contrários tentaram barrar a votação, alegando que as modificações propostas poderiam resultar na absolvição e na impunidade de réus envolvidos em grandes esquemas criminosos.
Por outro lado, parlamentares favoráveis às mudanças argumentaram que, quando o Estado não consegue provar a culpabilidade de alguém, como em uma decisão colegiada empatada, tem o dever de absolver tal pessoa.
“In Dubio Pro Reo”
Também conhecido como princípio do “favor rei”, a expressão “in dubio pro reo” estabelece que, em situações de dúvida, a interpretação que favorece o réu deve prevalecer. A finalidade é garantir a preservação da liberdade em face da pretensão punitiva do Estado.
Na teoria, o pressuposto deve ser respeitado durante todo o curso do processo, especialmente na fase decisória, seja em decisões de primeiro grau, de segundo ou de graus especiais ou extraordinários.
A adoção desse postulado é evidente no Código de Processo Penal, especificamente no artigo 386, que estabelece que “o juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: (…) VII – não existir prova suficiente para a condenação.”
Consequentemente, se o Estado não conseguir apresentar provas irrefutáveis da materialidade e autoria do crime, o juiz deve absolver o acusado.
“In dubio Pro Societate”
Outra premissa amplamente utilizada no Judiciário brasileiro é “in dubio pro societate”: oposta a “in dubio pro reo”, determina que, em caso de dúvidas sobre um assunto específico em um processo penal, a decisão deve ser favorável à sociedade.
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