Dados do COAF só com autorização judicial

COAF

É vetado pedido de acesso a dados direto ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF); autorização judicial é requisito

 

A sexta turma do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) tomou a decisão de vetar a solicitação de dados do COAF pelas autoridades de persecução penal sem autorização judicial. Foi essa a decisão do colegiado: é ilícita a prática de autoridades de investigação de pedir diretamente ao órgão a liberação de dados financeiros em casos sob a suspeita de prática de lavagem de dinheiro.

Essa decisão denota um endurecimento em relação ao entendimento do STJ de como os órgãos de investigação devem tratar dados monetários sigilosos. Além disso, também transfere ao Judiciário o poder de autorizar ou não a análise de tais dados.

O criminalista Sócrates Suares, especializado em segurança bancária e sócio do escritório Campos & Antonioli, ressalta que a matéria ora julgada pelo STJ já foi tema de repercussão geral e objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no final de 2019.

Precedente para decidir sobre liberação de dados do COAF

 

Ainda de acordo com o criminalista Sócrates Suares, a jurisprudência para decidir pela inconstitucionalidade da liberação de dados financeiros diretamente pelo COAF vem do Recurso Extraordinário 1055941/SP. À época, o relator do caso foi o ministro do STF, Dias Toffoli.

 

Assim, o criminalista explica: “Além de revogar a suspensão de caráter nacional dos procedimentos criminais que continham as informações sigilosas fornecidas pelo COAF, a decisão colegiada da corte fixou algumas teses em que o compartilhamento dos relatórios de inteligência é legal e constitucional”.

 

Segundo ele, tais teses são:

1 – É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil – em que se define o lançamento do tributo – com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo se resguardar o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional;

2 – O compartilhamento pela UIF e pela Receita Federal do Brasil (RFB) referido no item anterior deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.

 

O caso julgado pelo STJ

 

A sexta turma do STJ julgou o Recurso Ordinário em Habeas Corpus RHC 147707/PA, dando provimento à ação. Trata-se de uma investigação de lavagem de dinheiro contra dois empresários. De acordo com a denúncia, esses empresários teriam lesado o erário em R$ 600 milhões, mediante prática de 50 crimes fiscais.

Durante as investigações, o delegado responsável conseguiu dois relatórios de inteligência financeira produzidos pelo COAF. Esses relatórios apontaram, de forma contundente, a materialidade delitiva, vindo a servir como base para um pedido de busca e apreensão.

A defesa dos acusados, então, entrou com recurso alegando a ilegalidade da obtenção de tais relatórios, usando como argumento a decisão do STF, de 2019. Em suma, e como bem explicou o criminalista Sócrates Suares, esse compartilhamento direto só é possível mediante algumas hipóteses. As quais, no entendimento do colegiado, não se cumpriram neste caso.

 

Votação sobre liberação de dados do COAF não foi unânime

 

A requisição dos relatórios levou à comprovação de atos criminosos. Não obstante, a sexta turma do STJ decidiu por maioria de votos pela ilicitude do compartilhamento. O relator, ministro Antonio Saldanha Palheiro, teve seu voto acompanhado pelo ministro Sebastião Reis Júnior e pelo desembargador convocado Jesuíno Rissato.

O relator Saldanha argumentou que, autorizando a solicitação e compartilhamento direto entre órgãos investigativos e o COAF, abriria precedentes para a obtenção de informações sigilosas em qualquer inquérito.

O ministro Rogerio Schietti, por sua vez, abriu divergência ao votar pela legitimidade da obtenção dos relatórios do caso em questão. Vencido ao lado da ministra Laurita Vaz, ele afirmou que a hipótese dos autos não se enquadra nos precedentes. Isso porque, segundo ele, os dados não tratavam de informações sigilosas especificadas no Imposto de Renda.

Ainda de acordo com Schietti, o COAF apontou, nos relatórios, que houve apenas movimentação atípica. Então, caberia aos órgãos investigativos tipificar essa atipicidade como criminosa ou não.

 

Para o criminalista Sócrates Suares, a decisão foi acertada: “[…] em harmonia com o precedente firmado pelo STF. Assim, quando as solicitações de dados sigilosos e o compartilhamento dos Relatórios de Inteligência do UIF (antigo COAF) forem realizadas pelos órgãos de persecução penal, é indispensável autorização judicial para que as informações estejam revestidas de legalidade e constitucionalidade”.

 

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