Os crimes contra o consumidor e as relações de consumo estão previstos nas Leis nº 8.078/1990 e 8.137/90 depois de uma extensa evolução de proteção legal, com viés de questão socioeconômica com a devida proteção jurídica dos consumidores em uma sociedade livre e democrática.
O marco histórico da tutela jurídica das relações de consumo foi a Constituição Federal com seu artigo 5º, inciso XXXII: “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.
Quais os crimes contra o consumidor?
A Lei nº 8.078/90 que dispõe sobre a proteção do consumidor e elenca condutas entendidas como crimes contra as relações de consumo, quais sejam:
Art. 63. Omitir dizeres ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou periculosidade de produtos, nas embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade. Valendo esta conduta também para aquele que deixar de alertar sobre a periculosidade do serviço a ser prestado.
Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade ou periculosidade de produtos após sua colocação no mercado, assim como, deixar de retirar o produto.
Art. 65. Executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando determinação de autoridade competente. Com destaque para a possibilidade de aplicação das penas correspondentes ao delito de lesão corporal/morte previstos na Legislação Brasileira.
Interessante que neste artigo 65 o legislador afirma a possibilidade de responsabilização criminal quando da prática de permissão de ingresso, em estabelecimentos, de um número maior de consumidores do fixado como máximo, prevista no inciso XIV do artigo 39 desta Lei, que trata sobre as práticas abusivas.
Esta consideração criminal foi feita com o advento da Lei nº 13.425/2017 instituída para estabelecer diretrizes gerais sobre medidas de prevenção e combate a incêndio e a desastres em estabelecimentos, edificações e áreas de reunião de público.
Destaca-se que esta Lei nº 13.425/2017 foi aprovada ainda sob o impacto da tragédia da boate Kiss, que vitimou 242 pessoas na cidade de Santa Maria (RS), em 2012.
Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços. Valendo a conduta para quem patrocinar a oferta.
Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva.
Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança.
Art. 69. Deixar de organizar dados fáticos, técnicos e científicos que dão base à publicidade.
Art. 70. Empregar na reparação de produtos, peça ou componentes de reposição usados, sem autorização do consumidor.
Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer.
Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros.
Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre consumidor constante de cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber ser inexata.
Art. 74. Deixar de entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente preenchido e com especificação clara de seu conteúdo.
Para quaisquer dos crimes contra o consumidor acima, haverá a responsabilidade daquele que, de qualquer forma, concorrer para as condutas, inclusive, diretor, administrador ou gerente da pessoa jurídica que promover, permitir ou por qualquer modo aprovar o fornecimento, oferta, exposição à venda ou manutenção em depósito de produtos ou a oferta e prestação de serviços nas condições por ele proibidas.
A Lei nº 8.137/90, também define crimes contra as relações de consumo, em seu artigo 7º, quais sejam:
I – favorecer ou preferir, sem justa causa, comprador ou freguês;
II – vender ou expor à venda mercadoria cuja embalagem, tipo, especificação, peso ou composição esteja em desacordo com as prescrições legais, ou que não corresponda à respectiva classificação oficial;
III – misturar gêneros e mercadorias de espécies diferentes, para vendê-los ou expô-los à venda como puros; misturar gêneros e mercadorias de qualidades desiguais para vendê-los ou expô-los à venda por preço estabelecido para os demais mais alto custo;
IV – fraudar preços por meio de: a) alteração, sem modificação essencial ou de qualidade, de elementos tais como denominação, sinal externo, marca, embalagem, especificação técnica, descrição, volume, peso, pintura ou acabamento de bem ou serviço; b) divisão em partes de bem ou serviço, habitualmente oferecido à venda em conjunto; c) junção de bens ou serviços, comumente oferecidos à venda em separado; d) aviso de inclusão de insumo não empregado na produção do bem ou na prestação dos serviços;
V – elevar o valor cobrado nas vendas a prazo de bens ou serviços, mediante a exigência de comissão ou de taxa de juros ilegais;
VI – sonegar insumos ou bens, recusando-se a vendê-los a quem pretenda comprá-los nas condições publicamente ofertadas, ou retê-los para o fim de especulação;
VII – induzir o consumidor ou usuário a erro, por via de indicação ou afirmação falsa ou enganosa sobre a natureza, qualidade do bem ou serviço, utilizando-se de qualquer meio, inclusive a veiculação ou divulgação publicitária;
VIII – destruir, inutilizar ou danificar matéria-prima ou mercadoria, com o fim de provocar alta de preço, em proveito próprio ou de terceiros;
IX – vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma, entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo.
Percebe-se que a Lei nº 8.137/90 enfatiza a proteção dos interesses econômicos ou sociais do consumidor.
Relação de Consumo: O que é?
A relação de consumo é toda a relação existente entre consumidor e fornecedor, seja ele de um produto, ou de um serviço, que ocorrerá mediante a prestação de um serviço oferecido para uma atividade fim.
Crimes contra o consumidor pela internet: a quem recorrer?
Regulamentação nas relações de consumo via Internet
O uso da rede de internet acabou por trazer direito penal uma necessidade de aperfeiçoamento no combate aos crimes, dentre os quais os contra o consumidor, pois, a navegação virtual traz um mundo de difícil caracterização dos preceitos exigidos pelo Direito Penal clássico.
Especificamente no caso dos crimes contra o consumidor, a internet passou a ser um dos locais mais atrativos para o consumo e, por conseguinte ao empresário, de modo a facilitar a relação entre as partes interessadas no negócio. Seja ele de bens, produtos ou serviços.
Não estamos aqui falando de fraudes ocorridas na internet ou qualquer atitude ilícita manejada por uma das partes do negócio, visto que estas condutas abrangeriam outros delitos, ou a soma deles, aos crimes contra o consumidor.
Mas destaca-se que a internet deixou muito mais fácil a possibilidade de uma fraude intervir, auxiliar, corroborar ou perturbar a relação.
O uso da internet e o e-commerce tornaram-se parte do mercado de consumo brasileiro o que acaba por trazer à relação consumerista uma praticidade diretamente proporcional a uma certa insegurança/medo. Pois, é sabida a possibilidade de ser vítima de uma fraude seja ela na venda em si, seja ela na operação para concretização do negócio.
Assim, quando fala-se em internet, os crimes contra o consumidor extrapolam as relações das Leis nº 8078/90 e 8.137/90, pois demonstram a existência de uma fraude passível, também, de aplicação do Código Penal (estelionato – artigo 171; fraude no comércio – artigo 175; artigo 154-A e 154-B – trazidos pela Lei “Carolina Dieckmann” para combater invasões ocorridas na internet).
Além das disposições trazidas pela Lei do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) que acabou por auxiliar as autoridades na condução e apuração das fraudes perpetradas pela internet.
Portanto, mantemos a necessidade de recorrer às autoridades policiais e judiciárias para a devida apuração dos crimes contra os consumidores ocorridos pela internet que, por sua vez, estão legitimados a se estruturarem no combate à ação delituosa em redes de computadores, dispositivos de comunicação ou sistema informatizado.
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