Decisão do Supremo Tribunal Federal admite medidas restritivas, desde que não violem prerrogativas fundamentais e respeitem os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade
A Justiça no Brasil é frequentemente alvo de críticas e questionamentos por parte da população, devido à morosidade e às dificuldades em garantir o cumprimento das decisões judiciais. No entanto, uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pode representar um avanço nesse sentido. A corte declarou constitucional, em votação no retorno do recesso judiciário, a ação de retenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e do passaporte em cumprimento de ordens judiciais. A decisão foi tomada por maioria de votos e se baseou no dispositivo do Código de Processo Civil (CPC) que inclui ainda a possibilidade de suspensão do direito de dirigir, além da proibição de participação em concursos ou licitações públicas.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5941 foi movida pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e teve como relator o ministro Luiz Fux, que julgou constitucional a aplicação das medidas previstas no artigo 139, inciso IV, do CPC, desde que não violem prerrogativas fundamentais e respeitem os princípios de proporcionalidade e razoabilidade. A legenda defende que o cumprimento das decisões judiciais, por mais legítimas que sejam, não pode ferir direitos fundamentais e nem prejudicar o devido processo constitucional.
Ao negar a ADI, o ministro destacou que é necessária a apresentação do motivo das medidas por parte do juiz que as venha a aplicar. Segundo ele, isso ajudaria a evitar a recorrência abusiva e desproporcional da prerrogativa. “Se a medida típica for mais onerosa que a atípica, o juiz deve usar a medida atípica”, acrescentou.
Ainda de acordo com Fux, a decisão precisa estar em conformidade com os fatos e não representa uma “carta branca” para qualquer contexto. “O código consagra que o juiz deve atender aos fins sociais e à exigência do bem comum resguardando princípios”, pontuou. Durante a sessão, o relator explicou que dados fornecidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) comprovam que a maioria dos processos pendentes deriva da baixa efetividade da decisão de restrição de direitos.
Divergência
Demonstrando preocupação com a possibilidade de medidas atípicas na garantia da prestação pecuniária, o ministro Edson Fachin foi a voz discordante do julgamento. Apesar de não votar contrariamente à integralidade da matéria, o magistrado pediu que fosse determinada a inconstitucionalidade de normas ou interpretações que imponham restrições atípicas fora da obrigação alimentar.
Já o ministro Ricardo Lewandowski defendeu que o ordenamento jurídico apresenta garantias razoáveis para que os magistrados não se excedam sobre os direitos dos cidadãos ao estabelecer medidas atípicas. O voto dele foi de acordo com o relator, assim como os demais membros da corte: André Mendonça, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Nunes Marques e Rosa Weber.
Para o advogado-geral da União, Jorge Messias, os artigos do CPC são corretos e não interferem na garantia de liberdade ou locomoção, desde que aplicados de acordo com os direitos constitucionalmente assegurados à cidadania e de forma proporcional. Já o procurador-geral da República, Augusto Aras, considera que além de exageradas, as ações vão de encontro às liberdades fundamentais de ir e vir ou de circular pelo território nacional.
Inquérito das Fake News
Recentemente, o ministro Alexandre de Moraes solicitou a suspensão do passaporte do blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, que se encontra nos Estados Unidos, foragido da justiça desde que foi aberto mandado de prisão contra ele no Brasil. No momento em que a decisão foi expedida pelo Supremo, o blogueiro já havia se evadido do território nacional rumo ao país norte-americano. Apesar de sua saída ter sido considerada legal, sem o passaporte, ele passará a ser considerado imigrante ilegal.
Lula também
O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve seus documentos apreendidos em 2018, pouco antes de ser preso no âmbito da operação Lava Jato. Na época, o pedido foi movido pelo juiz Ricardo Leite, da 10ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal, que se valeu da medida quando o então ex-presidente se preparava para uma viagem à Etiópia para participar de uma reunião da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
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