A Câmara dos Deputados criou a Comissão Especial (Presidente, Dep. Joaquim Passarinho (PSD/PA) e Relator, Dep. Onyx Lorenzoni(DEM/RS) para analisar o projeto de lei de iniciativa popular nº 4.850/16. Com o apoio de mais de 2,5 milhões de pessoas, este projeto engloba o conjunto de 10 medidas de combate à corrupção propostas pelo Ministério Público Federal (http://combateacorrupcao.mpf.mp.br/10-medidas/docs/resumo-medidas-frente-verso.pdf). O presidente da Câmara dos Deputados estima votar o projeto em 9 de dezembro próximo, dia internacional Contra a Corrupção.
Segundo pesquisas recentes, a corrupção é um dos temas mais sensíveis para o brasileiro, acentuado pelas revelações do chamado Petrolão. Para o instituto Datafolha, em 2015, 34% dos entrevistados colocavam a corrupção como o principal problema do País. Um ano depois ocorreu um salto de 25 pontos percentuais na percepção dos entrevistados. Em janeiro de 2016, pesquisa da CNI mostrou que 65% das pessoas consideravam a corrupção o principal problema do País.
As propostas apresentadas pelo MPF provocaram profundas divergências entre estudiosos do direito e parlamentares.
A defesa
Concebidas pelos procuradores do MPF envolvidos na Operação Lava Jato, asmedidas têm como objetivo endurecer as regras e as penas para casos de corrupção e possuem três pilares: (i) prevenção; (ii) repressão rápida e (iii) recuperação de prejuízo, com retorno dos recursos aos cofres públicos.
Em termos de prevenção, a ideia é destinar um percentual do orçamento do Poder Executivo para campanhas educativas contra corrupção. O objetivo é “mudar a cultura” do recebimento de vantagens indevidas como algo normal no dia-a-dia da população.
Em termos repressivos, propõe o aumentoda pena mínima por crimes de corrupção para quatro anos. Penas menores podem ser revertidas em serviços à comunidade ou doação de cestas básicas. Uma pena mínima de quatro anosgeraria ao menos a punição em regime semi-aberto e teria como efeito o fortalecimento das ações de repressão. Os Estados Unidos e Hong Kong adotaram este caminho com sucesso. O texto prevê também a tipificação do desvio de valores acima de R$ 70 mil como crime hediondo, impossibilitando a concessão de anistia e de progressão do regime de cumprimento da pena.
Quanto à recuperação, os procuradores propõem o bloqueio de valores incompatíveis com o patrimônio de suspeitos que não tenham comprovação de licitude.
A crítica
Para os críticos, as 10 medidas são vendidas como a solução contra a corrupção, embora representem apenas propostas de alteração da legislação sem efetivamente contribuir para a estruturação dos órgãos de controle e repressão. Os críticos destacam que o sucesso da Lava Jato comprovaria ser possível combater a corrupção sem a necessidade de alterações na legislação, especialmente nos aspectos que restringem o direito de defesa dos investigados (aumento das hipóteses de prisão preventiva e limitação do alcance do habeas corpus) e ampliam os poderes dos investigadores (redução das possibilidades de anulação de provas e admissão de provas ilícitas desde que colhidas de “boa-fé”). Entidades que congregam advogados e professores de direito penal, como o IBCCRIM, se posicionam contrariamente ao projeto.
Inúmeros críticos consideram que as propostas no andamento de processos prejudicam garantias constitucionais, como a presunção de inocência e a ampla defesa e alterariam a definição de ilicitude de provas.
Para Gustavo Badaró, professor de direito processual penal da Faculdade de Direito da USP, a corrupção pode e deve ser combativa com outros remédios jurídicos, como o direito administrativo. Divide as 10 medidas entre “inconstitucionais ou desnecessárias”. Elas combatem os acusados e não os culpados de corrupção, devidamente condenados mediante o devido processo legal. Critica as propostas como medidas de marketing para facilitar o trabalho do MPF que tem o “ônus da prova” como acusador.